O que vemos, o que nos olha

“...eu busco essa reação, é intencional... porque a espontaneidade do olhar ela tem milésimos de segundos, dura muito pouco...” Mario Baptista

Uma ínfima fração de tempo revela a interação do fotógrafo Mario Baptista com quem ou o que observa. Num ato de entrega genuína às relações que estabelece, deixa-se ver, não quer ser testemunha ocular. Talvez um ato de reconhecer-se no outro em suas buscas íntimas. Mas é no olhar, ativo, reativo ou até imaginado, que um certo pacto se estabelece e é convertido em imagem.

“O que vemos, o que nos olha” é o título de um dos livros do filósofo e historiador Georges Didi-Huberman, cujas reflexões parecem se encontrar com as lentes e o olhar de Mario. A aproximação pelo ver não basta, é necessário abrir-se para ser explorado pelo outro e por nós mesmos. Desse instante, o autor aponta para a abertura de uma cisão, uma vez que aquilo que vemos passa a valer, ou até mesmo viver, apenas por aquilo que nos olha.

Mario registra esse lapso de vida que ocorre de olhares fortuitos, e que às vezes mesmo sem se buscar, se encontram. Seja de uma jovem num grafite que atrai o olhar de uma menina e nos faz especular sobre uma relação de identificação, ou de projeções de infância e juventude. Seja do próprio fotógrafo em suas errâncias e que parece dar-se conta de sua existência ao se desdobrar no olhar de um cão, no espreitar de uma criança. E em cada um desses instantes Mario traz pela técnica muito do universo em que essas conexões se estabelecem. Pelas cores, os focos de luz, os enquadramentos, o fotógrafo nos convida a essa busca pelo olhar e a uma percepção reflexiva de suas imagens.